Superada a fase das garrafas de palhinha, agora os rótulos são elegantes, frescos, ótimos para acompanhar comida ou serem tomados no verão
Desesperado com a própria ignorância, o consumidor de vinho é louco por regras e verdades imutáveis. Adora dizer que um tipo de vinho é ótimo e outro é muito ruim. Não quer pensar muito. Mas, sinto informar, não funciona assim. O setor de produção de vinhos é bastante dinâmico. As coisas mudam até nas regiões mais tradicionais — às vezes radicalmente. O público, no entanto, custa a assimilar essas mudanças.
O crescimento constante no nível de qualidade dos rótulos da região italiana de Chianti é mostra disso. Enquanto boa parte dos consumidores de vinhos finos ainda tem preconceito contra essa denominação toscana, especialistas cada vez mais celebram suas qualidades.
Pessoas do milênio passado devem lembrar de quando tomar um Chianti era razoavelmente chique. Aqui no Brasil, então, o Chianti era um dos poucos vinhos estrangeiros conhecidos. Mas não só por aqui: na maior parte do mundo, o Chianti era tido como um bom vinho.
Animados com o sucesso, no entanto, muitos produtores descuidaram da qualidade para apostar na quantidade, especialmente os grandes. Nos anos 1970 e 1980, o mercado foi invadido por rótulos de Chianti ruins e super valorizados. Espalharam-se garrafas de palhinha penduradas pelo teto das cantinas mundo afora.
Então, o consumidor da virada do milênio, que começava a se meter a entendedor de vinho, passou a torcer o nariz para todo e qualquer Chianti, especialmente em países do novo mundo, como Estados Unidos ou Brasil.
O que havia mudado, o vinho ou o consumidor? Ambos. Se por um lado o vinho caíra de qualidade, por outro o consumidor havia trocado suas preferências. Seu paladar havia sido influenciado pelo estilo Robert Parker: vinhos potentes, cheios de tanino, com passagens longas por barris de carvalho e aromas de baunilha, coco e chocolate, como o mais famoso crítico americano gosta. O oposto do que é um Chianti: um vinho fresco, frutado, de corpo médio e, nos melhores exemplos, bastante elegante.
Enquanto isso, lá em Chianti, ao mesmo tempo em que os grandes produtores apostavam em quantidade, surgiam pequenos e médios apostando em qualidade. Esses produtores começaram, por exemplo, a reduzir o rendimento das parreiras, o que garante uma uva com maior concentração de aromas, açúcar e acidez.
“Nos últimos dez anos, isso se intensificou e surgiu muita coisa de qualidade. Minha geração estudou fora, é muito consciente e quer fazer coisa boa”, diz a produtora de vinhos Faye Lottero, da vinícola Fattoria Lavacchio.
Segundo Giovanni Busi, presidente do Consorzio Vino Chianti, houve uma mudança de mentalidade. “Os produtores entenderam que investir em qualidade dá mais lucro”, disse durante um evento do consórcio em São Paulo . “O preço médio do Chianti subiu. Antes, os pequenos produtores não exportavam, mas hoje, mais importadoras trazem Chianti de qualidade para o Brasil.”
É preciso não confundir Chianti com Chianti Classico. São duas denominações muito próximas, mas diferentes, nas redondezas de Firenze, Siena e Arezzo. Embora a uva principal de ambas seja a sangiovese, geograficamente elas são distintas.
A região produtora de Chianti fica em volta da região de Chianti Classico. Esse último produz vinhos que podem custar tanto ou mais que um brunello di Montalcino e são bastante reconhecidos por sua qualidade entre os consumidores de alto padrão.
A vizinha Chianti produz vinhos mais baratos, mas não necessariamente piores. Os Chianti são vinhos leves, frescos, fáceis de tomar, mas dentro da denominação há uma grande variação de qualidade e de características.
Fonte: exame.abril.com.br